Prêmio “Nobel Verde” é concedido aos Sataré-Mawé pela certificação do waraná como IG, no coração da Amazônia

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Por Rogerio Ruschel

Meu querido leitor ou leitora, como publiquei em 2 de dezembro de 2020 aqui no blogue In Vino Viajas, a Terra Indígena Andirá-Marau, com 8.000 Km2, localizada na divisa dos estados do Amazonas e do Pará, conquistou a primeira Indicação Geográfica (IG) de Origem concedida a um povo indígena brasileiro – os Sateré-Mawé – em razão de dois patrimônios locais: o waraná (guaraná nativo) e o pão de waraná (bastão de guaraná).

Tão relevante, meu caro leitor ou leitora, que agora o povo Sateré-Mawé, uma comunidade étnica com cerca de 14.000 moradores em 120 aldeias e famílias produtoras do waraná, foi agraciado com o primeiro “Prêmio United Earth – Amazônia “, conhecido como “Prêmio Nobel Verde”, instituído este ano pela Família Nobel. O Prêmio, entregue em final de fevereiro em Manaus por Marcos Nobel, foi outorgado aos Sateré-Mawé por sua contribuição pela sobrevivência de seu povo e sua cultura e pela sua soberania alimentar numa região florestal.

A projeção internacional de seu trabalho foi obtida graças à primeira Indicação Geográfica (IG) concedida a um povo indígena brasileiro para o waraná (guaraná nativo), que repercutiu amplamente em circulos intelectuais e comerciais de alto nível na Europa.

O guaraná/waraná é uma planta mítica, mágica, muito importante para a comunidade, porque além de apresentar características únicas devido ao bioma local e o “saber-fazer” do povo indígena com seu modo próprio de cultivo e obtenção do produto.  O bioma é a bacia hidrográfica formada pelos rios Andirá e Marau que é o banco genético do waraná, o único no mundo; um santuário ecológico e cultural construído ao longo dos séculos.

Na verdade, o valor do waraná é muito mais amplo, porque, como eles informam, “É no waraná, este tipo exclusivo de guaraná de nosso território, que está todo o conhecimento do povo Sateré-Mawé”. Ou seja, a alma do povo está nesta planta – e o esforço da comuniasde em protégé-la (e a outros usos, costumes e sistemntas laimentares) é que os levou a ter o respeito internacional e receber o Prêmio da Familia Nobel.

A denominação de Origem levou 10 anos para ser concedida e teve o apoio do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), que atuou em quatro vertentes: identificação dos potenciais da região, contratação de consultoria, em parceria com a FAO, para desenvolvimento de ações de sensibilização, emissão de instrumento oficial para delimitação de área e forneceu suporte aos indígenas em relação ao pedido de registro no INPI. O processo teve também o apoio da Fundação Slow Food para a Biodiversidade e de suas iniciativas sempre estratégicas, como a criação da Fortaleza do Waraná, em 2002. Trata-se de um produto 100% brasileiro, reflexo da riqueza do nosso povo, da nossa tradição e da nossa biodiversidade

Na floresta, os Sateré-Mawé coletam as sementes que caem aos pés das plantas de waraná, trepadeiras selvagens de até 12 metros de altura, e as plantam em clareiras, onde são manejadas e mantidas em arbustos cultivados. Das sementes, por meio de métodos tradicionais de beneficiamento, os Sateré-Mawé obtêm um extrato muito nutritivo que combate o cansaço e estimula as funções cognitivas e a memória.

Para administrar o mercado de forma respeitosa e sustentável, foi criado o Consórcio de Produtores Sateré-Mawé (CPSM) que, por sua vez, faz parte do Conselho Geral da Tribo Sateré-Mawé (CGTSM), o maior órgão de representação política desse povo. O CPSM é responsável pela gestão, controle e comercialização do waraná em bastão e em pó, e representa os produtores Sateré-Mawé em eventos nacionais e internacionais, defendendo a causa indígena em diversos contextos políticos.

Um detalhe importante: um papel essencial na polinização da planta do waraná é desempenhado pela abelha canudo (Scaptotrigona xantothrica), na língua indígena Sateré-Mawé “Awi’a sese”, que também se tornou Fortaleza Slow Food por sua conexão ecológica com o waraná e o ecossistema. Trata-se de uma abelha muito resistente, que produz um mel extraordinário, com um sabor marcante e selvagem. A conexão dos Sateré-Mawé com essa abelha sem ferrão remonta à época pré-colombiana. O conhecimento tradicional Sateré-Mawé que quando Anumaré Hit subiu ao céu, transformado em Sol, convidou a irmã Uniawamoni para ir com ele. A mulher hesitou, mas depois decidiu ficar na Terra, transformando-se em abelha para cuidar, com os Sateré-Mawé, das florestas sagradas do waraná. Esse mito transmite o que os antigos Mawé já sabiam e que estamos redescobrindo hoje, ou seja, que as abelhas nativas sem ferrão são responsáveis pela polinização de 80% das espécies vegetais da Amazônia. Sem elas, a floresta desapareceria.

Para saber mais:

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Fonte:  Slow Food International

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