Saiba como a Itália promove seus produtos agroalimentares no Brasil – e porque e como vai continuar investindo

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Queijos parmesão: um modo de fazer queijos valorizado desde o ano 1200

Por Rogerio Ruschel

Exclusivo – Entrevista com Ferdinando Fiore, diretor da ITA – Italian Trade Agency no Brasil

Prezados amigo ou amiga, a Itália é um dos países europeus com mais tradição na produção, consumo e exportação de agroalimentos tradicionais, produzidos por agricultores familiares e empresas de pequeno ou médio porte. É o segundo país europeu que mais exporta estes produtos para o Brasil, e depois dos Estados Unidos, o Brasil é o mercado mais importante dos italianos nas Americas. A cultura italiana – especialmente por causa da música, gastronomia e dos vinhos – é muito querida e prestigiada no Brasil, onde vivem cerca de 28 milhões de descendentes – 13 milhões dos quais no Estado de São Paulo.

Lamentei com amigos italianos o choque do Covid-19, mas acredito que logo vão se recuperar. Por isso gostaria de saber: no que se refere a seus produtos, o que vai acontecer agora, no periodo de pós-pandemia Covid-19? Para descobrir e compartilhar com meus leitores de In Vino Viajas, entrevistei Ferdinando Fiori, Diretor da ITA – Italian Trade Agency em São Paulo. Veja só o que ele nos informou.

R. Ruschel – Qual a política de promoção dos agroalimentos italianos no Brasil; quais as principais iniciativas realizadas nos últimos anos e qual será a política a partir de 2021, que deve ser o primeiro ano pós-Covid19 e pré-Acordo Mercosul X União Europeia.

Ferdinando Fiori – Os laços que unem Itália e Brasil remontam há quase 200 anos, tendo início com a vinda para o Brasil na segunda metade do século XIX de diversos artistas, intelectuais e estudiosos italianos (italianos no sentido que eram originários dos estados que compõem a atual Itália, cuja constituição atual é posterior – sobre isso veja nota (1) abaixo), por ocasião do casamento de D. Pedro II com a princesa das duas Sicílias, D. Teresa Cristina.

Esse embrião da forte presença italiana no quotidiano brasileiro tomou força com as corrente migratórias, primeiro para substituir a mão-de-obra escrava e, num segundo momento, para dar impulso à florescente indústria. Ao longo desses anos e tendo os italianos e descendentes residentes no Brasil atingindo uma população de mais de 28 milhões de pessoas, dos quais 13 milhões apenas no estado de São Paulo, foi inevitável a influência itálica na cultura brasileira e, em especial, à gastronomia do Brasil. (Sobre este assunto veja nota (2), abaixo).

A culinária italiana está entre as mais apreciadas no Brasil (e no mundo) e isso se nota pelo grande número de restaurantes, pizzarias e cafés existentes no Brasil, especializados na culinária da Península, ainda que por vezes com adaptações de ingredientes e interpretações no modo de preparar ou de servir que se afastam (por vezes muito) do modo de ser italiano.

Essa receptividade aos Sabores da Itália é certamente devida à multiplicidade de pratos, mas também à simplicidade de como são feitos, com poucos produtos, mas de excelente qualidade. E é aí que entra o trabalho da ITA – Italian Trade Agency, ou seja, o de aliar a receptividade dos brasileiros à culinária italiana à promoção dos produtos feitos na Itália, por vezes segundo técnicas seculares e, em muitos casos, tuteladas por selos de qualidade (os chamados DOP, DOC, DOCG e IGP), aumentando o consumo dos mesmos. (Veja nota (3), abaixo, sobre isso).

Entre essas ações, figuram as missões de compradores e jornalistas às principais feiras e distritos produtores italianos, entre os quais as feiras Cibus, Vinitaly, Interpoma e Macfrut, bem como como os distritos produtores de massas, Gragnano, ou de tomates, em Salerno, entre vários outros. Este ano, por causa do coronavirus, esses eventos ganharam contornos digitais, mas com o controle da pandemia, esperamos poder voltar aos encontros presenciais a partir do ano que vem, levando para a Itália uma centena de formadores de opinião que selecionam e trazem para o Brasil os produtos e sabores que serão consumidos por aqui numa área cada vez muito além do que São Paulo e outros grandes centros do Sul e Sudeste, sendo os produtos italianos também demandados no Centro-Oeste e em muitas cidades do Norte e Nordeste do país.

E não nos restringimos exclusivamente a levar compradores e formadores de opinião para a Itália. Também trazemos os produtores italianos para o Brasil, bem como reforçamos a imagem daqueles que já se encontram por aqui. Participamos, portanto, de feiras como Fispal Food Service e Wine South America, para citar apenas duas de relevância nacional, bem como organizamos ações de comunicação e promoção em pontos de vendas e canais de vendas eletrônicas. Esse é o caso da campanha Sabores da Itália, que este ano envolve a participação de 6 importantes cadeias de supermercados de São Paulo, Santa Catarina, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Brasília e Paraná, além do canal de vendas eletrônicas de vinhos, EVINO, com cobertura nacional.

Durante essas campanhas, apresentamos os genuínos sabores da Itália, ensinando como usá-los e oferecendo-os a preços promocionais, de modo que possam ser consumidos por um número cada vez maiores de brasileiros. Falando em ensinar, aliás, também realizamos cursos de formação para chefs e amantes da gastronomia e este ano, sempre impulsionados pelos efeitos da pandemia, lançaremos, durante a V Semana da Cozinha Italiana no Mundo, uma webserie em 7 capítulos, um para cada dia da semana, que vai de 23 a 29 de novembro, que ensinará 7 pratos da culinária italiana, da tradicional à contemporânea.

Aliás, a Semana da Cozinha Italiana no Mundo é um dos instrumentos que usamos, sob o comando do Ministério Italiano das Relações Exteriores, para promover a excelência da cozinha italiana e de seus produtos. Nessa semana, que acontece há 5 anos, sempre em novembro, todas as cidades do mundo nas quais há uma representação diplomática italiana, realizam ações para promover a cozinha italiana e seus elementos distintivos.   

Rogerio Ruschel – Qual a importância do mercado brasileiro para agroalimentos italianos, excluindo queijos e vinhos? E incluindo estes produtos?

Ferdinando Fiori – Nos 10 primeiros meses de 2020 o Brasil importou da Itália o equivalente a 169 milhões de dólares, projetando até dezembro algo em torno de 219 milhões de dólares, ou 2,7% de tudo o que o Brasil importa de alimentos e bebidas, inclusos queijos e vinhos. Essa cifra faz da Itália o segundo principal fornecedor dos brasileiros entre os países europeus, logo atrás de Portugal (4,8%), cujos laços com o Brasil são ainda mais antigos do que os mantidos com os italianos. Além do mais, o Brasil é o segundo principal mercado dos italianos nas Américas, depois dos Estados Unidos. As importações brasileiras de vinhos projetadas para 2020, provenientes da Itália, são de 34 milhões de dólares. As de queijo são de 3,4 milhões de dólares.

Rogerio Ruschel – Qual a importância dos produtos italianos (agroalimentos e não alimentos) com Identificações Geográficas? Em 2017, 20,4% dos produtos com IGs vendidos dentro da União Europeia eram italianos. E no mercado brasileiro?

Ferdinando Fiori – É difícil dissociar uma coisa da outra. Grande parte dos produtos provenientes da Itália são de origem controlada, até porque existem mais de 300, entre os alimentos e bebidas, e outros 400, entre os vinhos. (Veja abaixo como obter estas listas).

Rogerio Ruschel – Qual o impacto da pandemia do coronavirus sobre os agroalimentos italianos – produtores, produtos, consumidores internos e exportações?

Ferdinando Fiori – Em linhas gerais, podemos dizer que o impacto tem três vertentes: 1) impediu o funcionamento ou diminuiu a frequência em restaurantes, que são um importante canal consumidor dos produtos italianos; 2) a pandemia acabou provocando uma relevante desvalorização do Real (mais de 35% desde o começo do ano), o que também afetou o consumo dentro de casa de algumas categorias de produtos importados, particularmente num momento de incertezas, em que a garantia do emprego era incerta; 3) a rigorosa quarentena imposta na Itália fez com que o consumo dentro de casa disparasse, reduzindo a oferta de tais produtos para a exportação. Por conta disso, projeta-se para 2020 uma diminuição das importações provenientes da Itália em cerca 2,3%.

Rogerio Ruschel – Qual o impacto do Brexit sobre a exportação dos agroalimentos italianos, incluindo queijos e vinhos?

Ferdinando Fiori – Os efeitos do Brexit ainda não puderam ser sentidos. O Reino Unido permanece um importante mercado para os italianos, representando 8,5% de suas exportações de alimentos e bebidas (3,6 bilhões de dólares). Muito provavelmente, o quadro não deve mudar, pois acordos bilaterais certamente seguirão à saída do Reino Unido do bloco, a qual  ainda não foi 100% efetivada.

Rogerio Ruschel – Já é possivel dimensionar o impacto das super-taxações dos Estados Unidos (caso Boeing x Airbus) sobre a exportação dos agroalimentos italianos, incluindo queijos e vinhos?

Ferdinando Fiori – Não parecem ter tido impacto, pelo menos até o momento. Os Estados Unidos são o segundo maior mercado dos italianos no segmento de produtos alimentares e bebidas, com quota de 11,8%, inferior apenas à verificada com a Alemanha, que é de 17,3%. Os números projetam para 2020 um aumento das exportações do setor para os Estados Unidos em 3,9%, atingindo a importância de 5 bilhões de dólares.

Rogerio Ruschel – A Itália tende a aprovar o Acordo Mercosul X União Europeia?

Ferdinando Fiori – É ainda prematuro falar sobre isso. O que se pode dizer é que esse é um acordo em que todos tendem a ganhar.

As fotos são livro “Giro d’Italia”, de J.A. Dias Lopes, disponível gratuitamente em www.saboresdaitalia.com.br

Prezado leitor ou leitora: In Vino Viajas dispõe de uma lista com 305 agroalimentos italianos protegidos por DOP, DOC, DOCG e IGP; dispomos também de uma lista com 407 vinhos DOP e 118 Vinhos IGP. Todas as listas são atualizadas e oficiais. Caso queira uma cópia, solicite aqui pelo blogue.

Para saber mais:

(1) Talian, o idioma italiano que só existe no Brasil: http://www.invinoviajas.com/2015/10/veneto-trentino-e-toscano-veja-como/

(2) A cultura italiana na festa do filó italiano: http://www.invinoviajas.com/2014/01/filo-italiano-abre-vindima-2014-do-vale/

(3) O trabalho da Cittá del Vino – http://www.invinoviajas.com/2015/08/citta-del-vino/

Saiba mais sobre a Itália e seus produtos: http://www.invinoviajas.com/?s=italia

Vídeos curtos e divertidos sobre a cultura italiana no Brasil:

Filó Italiano: https://www.youtube.com/watch?v=dwkFIgAlDSA

Talian: https://youtu.be/cZb7RK6KuG0

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