Valorizar produtos com Indicação Geográfica no Brasil: uma corrida com dificuldades que poucos estão vencendo

Tempo de leitura: 5 minutos

Por Rogerio Ruschel

Estimados leitores e leitoras, chegar à possibilidade de integrar uma cadeia produtiva de um produto que conquistou uma Indicação Geográfica é um importante trunfo, desde que isso se transforme em benefícios utilizando as regras de marketing e do mercado. No entanto, para chegar a este pequeno grupo de qualificados (atualmente cêrca de menos de 10.000 produtores e empreendedores no Brasil) é preciso muito trabalho, muito aprendizado, muita dedicação – muito suor.

Primeiro tem o suor para obter o reconhecimento de uma Indicação Geográfica: é necessário vontade, mobilização, pesquisa, dedicação, muita união entre concorrentes e parceiros e muito investimento, valores que podem chegar a R$ 1 milhão como certa vez informou oSebrae. Criar uma IG exige a convergência de muitos saberes, alguns técnicos e outros culturais, outros ainda sociais e da tradição. Definido e mapeado o perfil da matéria-prima, o processo produtivo, o local de produção e o produto ou conjunto de produtos a serem certificados, enfrenta-se uma série de etapas burocráticas no INPI – Instituto Nacional da Propriedade Industrial (órgão governamental que concede os registos no Brasil) em um processo que pode levar até mais de 3 anos.

Mas mesmo depois da concessão do registro como uma IG o trabalho não terminou, porque é necessário que o gestor da IG – uma associação empresarial, uma estrutura gestora da cadeia produtiva – continue a corrida de obstáculos para levar seus produtos ao mercado e obter os beneficios de uma valorização de até 270% do produto, segundo estudos da European Comission. Gestores do ramo com quem tenho conversado informam que isso é muito dificil. Jaime Milan, assessor técnico das IG e DO “Vale dos Vinhedos”, da Serra Gaúcha – a primeira do Brasil, estruturada há 23 anos, que reúne empresas experientes e que já exportam – e Ton Lugarini, conselheiro da IG Erva Mate de São Mateus e Coordenador do Fórum Origens Paraná de IGs, que está no caminho para chegar lá. Ambos me confirmaram as dificuldades que começam internamente: convencer os produtores a valorizar a certificação. Milan foi o presidente (2021-2023) da ABRIG – Associação Brasileira das Indicações Geográficas e Lugarini é o atual (2024-2025).

Encontrei um resumo organizado destas dificuldades no estudo “Geographical indications and territorial development: A soft‐system methodology analysis of the Serro Case”, publicado no Wiley Systems Research and Behavioral Science 2020;37:82–96. Embora esteja tudo em inglês, o estudo foi realizado pelos pesquisadores brasileiros Mirna de L. Medeiros, Leonardo Augusto Amaral Terra e João L. Passador. Mirna é professora do Departamento de Turismo da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG); Passador é da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FEA‐RP/USP) e Amaral Terra é pesquisador do Centro de Estudos em Gestão e Políticas Públicas Contemporâneas (GPublic/USP), de Ribeirão Preto-SP. O estudo foi preparado sobre o ambiente produtivo do Queijo Serro, de Minas Gerais cinco anos atrás.

Perguntei para a professora Mirna Medeiros quais as dificuldades ou limitações enfrentadas pelos produtores e gestores de produtos com Indicação Geográfica no Brasil? Veja o que ela me respondeu na entrevista que é complementada pelo  resumo no quadro abaixo.

“Este trabalho que você está analisando é oriundo da minha tese de doutorado que enfocou a realidade da IG do Serro naquela época. Alguns desafios podem ser específicos e decorrentes das características do setor queijeiro, bem como da organização local. Contudo, de uma forma mais ampla, alguns desafios se aplicam a quase todos os setores quando se pensa em implementar e utilizar esse signo distintivo da Indicação Geográfica em uma região.

Primeiramente é fundamental a compreensão do que se trata a IG, qual o nome geográfico representativo da região, quais os benefícios e trabalho necessário para que o “selo” possa gerar esses benefícios entre outras questões que perpassam a superação de desconfianças e conflitos de interesse, a motivação e qualificação de produtores.

Também destaco os fatores socioculturais no que tange à compreensão do valor do produto ou serviço como ativo daquele local, bem como a necessidade de enxergar os outros produtores como parceiros e não apenas concorrentes. Isso porque a cooperação e o associativismo são fatores fundamentais para o fortalecimento de uma entidade representativa que possa pleitear, operacionalizar a utilização do “selo”, ou fiscalizar esse uso com seu conselho regulador.”

A professora Mirna continua: “Em seguida há a questão social da organização da cadeia produtiva, relações entre os diversos membros e busca pela distribuição dos benefícios eventualmente gerados por uma IG.

Essas questões implicam a necessidade de uma administração estruturada para planejar, organizar, dirigir e controlar o uso da IG, bem como fazer uma gestão de marketing que destaque os diferenciais do produto e do território.

Por fim, custos de adequação, de estocagem, de distribuição, entre outros custos, bem como questões normas sanitárias ou técnicas de cada setor não podem ser desconsideradas.”

Creio que o quadro e o depoimento permitem que o leitor ou leitora possa avaliar o esforço, e que tudo isso seja mais um incentive para superá-los. Brindo a isso.

Saiba mais sobre a primeira IG do Brasil : https://www.invinoviajas.com/vale-dos-vinhedos-comemora/

Conheça um pouco sobre as IGs da Europa: https://www.invinoviajas.com/uniao-europeia-tem-3-435-produtos/

Veja quanto vale o Mercado de IGs na Europa: https://www.invinoviajas.com/r-347-bilhoes/

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